14 junho, 2018


O Brasil, em que pese ter passado por algumas reformas no que diz respeito ao modelo de Estado, ainda não conseguiu se desvincular totalmente de um modelo Patrimonialista de sociedade. Esta herança - por intermédio do sistema de cargos comissionados, dentre outros elementos - mantém forte sua presença no atual modelo de gestão da Administração Pública.

Isso, de certa forma, repercute na atuação do Estado e em suas relações com os demais atores sociais, que veem na defesa de interesse uma forma legítima de se fazer ouvir pelos tomadores de decisão.

Tradicionalmente, olhava-se para a legislação em vigor como algo pronto, sem levar em consideração todo o seu processo de formação, de modo que essa cultura demonstrava uma falta de reconhecimento do Legislativo como instância legítima para os debates legais ao transferir para a instância jurídica o momento no qual se dava a análise da legislação, bem como a discussão sobre a formação legislativa.

Ocorre que todo o processo legislativo se inicia com a identificação de uma demanda social que necessita ser melhor tratada pelo poder público. Daí, entram em cena os mais diversos atores que pretendem se fazer ouvir. Esses interlocutores sempre existiram e a possibilidade de regulamentação da atividade do lobby no Brasil não é tão recente. Em 1990, foi apresentado, pelo então Senador Marco Maciel o Projeto de Lei n°6.132 que, em razão da polêmica e dos preconceitos em torno do tema, não avançou. Em parte, isso se deveu ao fato de a democracia brasileira ser relativamente recente, uma vez que reinstituída pela Constituição Federal de 1988.

Antes do processo constituinte de 1988, havia pouco espaço para discussões de interesse social, de modo que o lobby era exercido por aqueles que de alguma forma tinham conhecimento ou proximidade com o poder constituído. Neste sentido, o lobby institucional e o amplo exercício da prática de advocacy retomaram seu desenvolvimento justamente no momento das discussões da elaboração da nova Constituição (1986-1988), vez que vários setores aproveitaram a oportunidade para se fazer ouvir.

Há que se ressaltar que a atividade do lobby está intimamente relacionada ao modelo democrático e à sua dinâmica, de modo que foi necessária sua consolidação para que se pudesse tratar da regulamentação de tema tão importante como o da legitimação da defesa de interesses, uma vez que resta claro que essa atividade sempre esteve presente em todos os tipos de organização política dada a sua característica informativa e capacidade de criar e agir como um canal entre as diversas faces da organização política.

Somente em 2008, o Ministério da Justiça tomou a iniciativa de enfrentar o tema de modo que as discussões abrangessem as mais diversas esferas governamentais e da iniciativa privada/sociedade civil pelas modificações constantes nas relações entre público e privado. Essas modificações deixaram clara a necessidade de regulamentação da defesa de interesses como uma forma de legitimar a participação da sociedade civil no processo decisório.

Uma das maiores dificuldades quando se trata do tema é justamente saber o conceito e a finalidade do lobby no Brasil e entender a razão do porquê de ele estar associado equivocadamente a atividades ilícitas. Essa é a razão pela qual, durante muito tempo, setores relevantes da sociedade evitavam emitir opiniões sobre a regulamentação do lobby ou mesmo se identificar como "lobistas".

A retomada do tema em 2008 trouxe a ele uma visibilidade que permitiu a realização de uma ampla discussão sobre sua finalidade e limites, dissociando assim a atividade de defesa de interesses de qualquer atividade ilícita, bem como demonstrando a necessidade urgente de sua regulamentação para a consolidação, efetivação e o bom funcionamento do Estado Democrático de Direito.

A relevância do estudo anteriormente mencionado se deu pela retomada do tema, pelo levantamento minucioso de como essa regulamentação se deu em diversos países, pela análise das variadas experiências internacionais e pelo desenvolvimento de mecanismos de transparência como instrumentos capazes de controlar a atividade de intermediação de interesses e evitar novamente sua indevida associação a atividades ilícitas.

Pela carga negativa da expressão, há inclusive inúmeras sugestões de mudanças de denominação da atividade para relações governamentais ou advocacy, não havendo unanimidade na proposta. Quem defende a expressão advocacy justifica que o termo engloba as atividades de identificar, defender e promover as causas em questão, sendo, portanto, gênero do qual lobby seria espécie. Já os que defendem a expressão relações governamentais considera que a atuação estaria ligada a aplicação de técnicas de comunicação por pessoas e instituições almejando influenciar as decisões a serem tomadas pelo Governo. 

Polêmicas à parte, o que se sabe é que a alteração da nomenclatura poderia ser um facilitador para a aprovação da regulamentação no Congresso e para a sua maior aceitação por parte da sociedade.  

Aliás, um dos fatores apontados para a associação indevida entre lobby e atividades ilícitas está na falta de conhecimento da população em geral do que seja a atividade de defesa de interesses e esse é um dos principais desafios daqueles que atuam com lobby, pois a regulamentação necessita do apoio da opinião pública e essa somente virá quando não pairar dúvidas sobre quais sejam as propostas e interesses dos lobistas, aumentando, desta forma, o nível de informações disponíveis. Assim, efetivar-se-ia o modo de atuação da sociedade organizada.

Apesar de ter novamente arrefecido a discussão do tema, ele volta à baila nos dias de hoje, ficando cada vez mais claro que é uma medida de transparência e um poderoso mecanismo de combate à corrupção, vez que seu objetivo é o de refinar e aprimorar a comunicação entre os agentes públicos e a informação disponível aos envolvidos direta ou indiretamente no processo de tomada de decisão.

Atualmente, o tema está para ser analisado pelo Congresso Nacional e trataremos de seus desdobramentos no próximo artigo. 

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