22 abril, 2016

Análise - 17 de março de 2016

Márcio O. Fernandes  - Analista Político da Quorum Consultoria Política & Relações Governamentais




Que o Brasil é um país complexo disto todos sabemos. Imensidões territoriais, grande concentração de renda, forças políticas em disputa por vezes traumática  e uma enorme dificuldade em romper com experiências ruins do passado. De fato, “o Brasil não é para principiantes”. Colocar a casa em ordem ou, ao menos, estabelecer os rumos para o desenvolvimento de um país continental não é tarefa para indivíduos, mas para gerações. Por isso, as particularidades e os desafios de um país como o nosso devem ser vistos com respeito e cautela pelos chefes políticos de ocasião.    

> A Crise no Brasil e seus imperativos

Neste sentido, tal como em 2013, é preciso salientar: o momento dramático da política nacional é também [mas não só] reflexo da extrema inabilidade com que o atual Governo enfrentou os imperativos da política e da economia nos últimos cinco anos.
No âmbito das grandes estratégias, o Planalto foi insensível, errático e absorto por um prisma reducionista das realidades brasileira e internacional. Na esfera tático-operacional (no dia-a-dia das gestões setoriais), mesmo entre seus quadros de menor escalão, o Governo adquiriu muitas vezes traços soberbos, de arrogância e de indiferença.
Ao longo dos anos, formou-se um ambiente de extrema animosidade em Brasília, propício ao descontentamento geral de atores e partidos políticos já acostumados às benesses das relações entre Congresso e Planalto. Enquanto a economia pôde ser sustentada e submetida às necessidades do processo eleitoral de 2014, o ambiente político manteve-se razoavelmente suportável. Hoje, com o país economicamente prostrado, a inaptidão do Governo (e, especialmente, de Dilma) é destacável a uma elevadíssima potência.
É necessário reiterar: trata-se de Presidência com enorme grau de fracasso quando comparada aos mandatos exercidos após a promulgação da Constituição de 1988 (para não irmos além). No âmbito da gestão econômica, talvez quase que se equipare à célebre fuga de realidade do período que marcou a transição entre os Governos do Visconde de Ouro Preto (último Presidente do Conselho de Ministros do Império) e de Deodoro da Fonseca (primeiro Presidente da República). E isso já faz seu tempo. É um Governo fustigado, exausto, com uma Chefe de Governo politicamente em choque. Como resultante, alimenta-se uma constatação [já não tão] tácita nos corredores de Brasília: a atual mandatária é uma figura que não estava talhada para as tarefas do cargo que ocupa.

> A resistência aos fatos e a crueza de um Sistema Político "inflado"

Entre os distintos agrupamentos que hoje disputam o poder, ainda há resistência quanto à aceitação dos acontecimentos. De diversos lados, proclamam sensações de injustiça, de desrespeito, de quebra de garantias constitucionais. No entanto, a política tem seus ditames e, submetida a pressão, exige soluções práticas. Se não houver sinalização de um desfecho razoável a ser oferecido pelos atores de destaque, o sistema político buscará a sua válvula de escape.
Há um alerta importante: diante da gravidade de crises políticas, econômicas e da paralisia dos atores tradicionais, um sistema político tende a ser "inflado" pela entrada de agentes até então externos a ele (ou que, antes, apenas o tangenciavam). A sucessão dos acontecimentos pode levar estes novos atores a participar de um campo [próprio das disputas de poder] que não lhes é natural. Constitui-se, assim, o risco das instabilidades dos "governos aventureiros", dos discursos "demagógicos", dos "neopopulismos". Crises inicialmente restritas à esfera das elites governamentais podem tornar-se também legislativas, jurídicas, corporativas e populares. As tensões políticas, assim, acabam por impregnar os mais diversos níveis da vida social.

Neste processo, um "sistema inflado" pode não clamar por justiça ou injustiça, pelo certo ou pelo errado. Isso porque o Sistema Político - se me permitem uma designação mais ampla, para além das instituições e dos atores políticos tradicionais - é apenas uma abstração conceitual usada para designar um emaranhado de forças sociais, cenários, tendências e acontecimentos que se manifestam na política nacional. Em seu conjunto, tais componentes não têm sentimentos claramente identificáveis, nem distinguem com precisão o que é prudente ou precipitado. E, em nosso caso concreto, enquanto os atores tradicionais (e especialmente o Governo) continuarem a praguejar contra a "maldição" dos eventos - paralisados por suas lógicas internas -, permanecerão submetidos ao risco iminente de serem engolidos por este sistema político inflado que, sem filosofismos, encontrará sua "solução" para o impasse do país. Com mais ou menos dor.

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